terça-feira, 22 de setembro de 2009

QD (cont) PARTE OITAVA

São Luís, 22 de setembro de 2009


O esporro

DO FIM DA RUA, onde estava o velho Valdir, dava pra ver a outra rua, a casa. Eu caminhava lentamente, pelo medo e pelo cansaço. Estava eu chegando à casa junto com uma dor na cabeça, que se espalhava pelos ombros, costelas, espinha, até latejar nas pernas; chegava também um resfriado (o nariz escorria e de quando em quando espirrava). Um fluído incógnito fluiu pelas veias, senti algo parecido com adrenalina, ao ver a casa com as luzes acesas. Mas ainda havia esperanças em mim; até o fim podia acreditar que os velhos não tomavam conhecimento da minha fuga; mas tudo desmoronou quando vi a tia velha na sacada, sentada na cadeira preguiçosa ― não pude notar se dormia. Tive uma súbita idéia de desviar o caminho e entrar pela janela por que fugira, mas ouvi rumores na sala de estar; uma silhueta magra e lenta aproximou-se da janela, colocou rosto fora, e os olhos trêmulos encontraram os meus num instante; sério e fixo e um desapontamento estampado nas rugas e na rabugem da idade. Disse-me “boa noite” com a voz bem entoada, firme; eu o respondi com um espirro, e depois outro. ― fato este que fez a velha acordar em sobressalto. A velha tinha um ar pacífico, brando; mas não falara palavra (tive receio, pois desconfiava que debaixo daquela placidez houvesse uma raiva febril). Adentrei junto cm a velha; o velho tio fazia caminho da janela até a poltrona; retomara a posição de costume: pernas cruzadas e cachimbo na mão. A atmosfera era pesada na sala de estar por causa do fumo espesso que flutuava; presumi que o velho fumava com demasia, quando atribulado. Deixei-me estar num canto da casa, a vista do velho, tremendo, espirrando e molhando o piso de madeira com a água que escorria da roupa molhada.
― Você tem noção do que fizeste, garoto?
Aquele “garoto” soou com desdém; senti-me destroçado, pois sem sombras de dúvidas tinha eu causado fúria no velho, notava-se pelo tom da voz e pelo modo de balançar a cabeça.
― Você prometeu falar com ele só amanhã, meu velho ― disse a velha ― olha só o estado do menino (o “menino” me fez sentir mais infantil do que o irmãozinho de Monise); deve trocar de roupa imediatamente. Olha só como molha o piso! Vá, vá, vá, meu filho!. Enquanto isso eu vou lhe preparar um chá. Veja como espirra! Sorte sua se não adoecer feio.
Eu não tinha cara pra meter em nenhum buraco de tanta vergonha, enquanto a velha caminhava lentamente e o clima pesava; tanto que não falei palavra, e omiti toda a dor que sentia naquele momento. Fez-se o silêncio mais aborrecedor da minha existência. Deslizei da sala para o banheiro olhando para o tio, que resmungava baixinho e olhava para um ponto fixo que não me fiz saber.


Quem na cozinha medita?

LI UMA VEZ em um clássico da literatura: “Só as grandes paixões são capazes de grandes ações”. Não sei se correr atrás de uma promessa insana pode se encaixar no que o autor intitula “grandes ações”. Ora, grandes ações, cuido eu, equivale a belas ações, bem-feitas ações, aquelas que abeiram o êxito a cada ocorrência, até chegar o soberano golpe final, o que bate martelo, o que fecha conta, o que eterniza o mérito. Não os que te rendem esporros, resfriados, dores musculares e te deixam na penumbra da cozinha tomando chá em companhia de uma velha de olhos secos e de um ar assombroso. Porventura, lembrei-me de uma proposição do mesmo autor: “Quem escapa a um perigo, ama a vida com outra intensidade”. Querendo ou não, parte da minha vida tinha sarda e nome: Monise.
Por mais que uma parte da minha lucidez repetisse incessantemente ao meu ouvido “Amor prematuro! Prematuro! Prematuro”, parte da minha ‘maluquês’, com a boca suja e a cara limpa, retrucava “prematuro é o ‘caralho’”.

― Quer mais chá, sobrinho? Disse à voz que surgiu da penumbra, ao mesmo tempo em que bocejava.
― Não... Não... Obrigado, tia. Quero mais é ir pra cama.
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O castigo (No proximo)
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Um comentário:

Samyle Lindsay disse...

'Prematuro é o caralho'
shauhsuahsuhaushauhsuahsuha
Leonel desbocado. :D

Coitados dos velhos...
Mas o amor mexe com a cabeça das pessoas mesmo!

:)


Aaaah, adorei esse negocio de 'notícias do blog agora em seu celular'
hsuahsuhaushauhsuahsuahsuah
Morri de rir! :D
A Lorrayne já havia me falado que tu tinha pedido meu numero. Agora sei pra quê.
RSS nem é mais necessário. ;]

Beeeijo ;*