quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Qause Delírio (Parte Quinta)

Cont

DEMORAMOS NO MIRAR, face a face, muitíssimo próximos; ela com o olhar caído e eu a olhando fixamente nos olhos; já podia eu sentir o calor que ardia no rosto dela. Monise, por mais que ofegasse, por mais pressionada que estivesse não cedia palavra alguma sobre o olhar que se escondeu atrás das dunas, o segundo olhar, o que me rendeu dúvidas entre a confirmação ou o arrependimento. A moça, que já tremia um tanto quanto eu, fechou os olhos e os abriu com rapidez, e demoramos mais ainda nesse embaraço. Os lábios chegaram a se tocar muitíssimo brevemente, nada que podia ser considerado um beijo, nem quase beijo, nem beijo involuntário, nem beijo algum. Fato este que fez Monise, com um movimento arrebatado, separar-se de mim com um empurrão e um gemido fraco e breve (com força de mais pra uma menina). Dessa forma, separamo-nos e fiquei eu a ver o cenário do lado de dentro da cabaninha por um rombo da porta velha, na mesma posição onde estava a segurar a mão da sardentinha; esta caminhou até próximo ao banquinho (onde nós outrora sentávamos), aturdida pela situação embaraçosa, talvez estivesse sentindo medo, ou estava envergonhada, só sei que alguma coisa sentira. Monise cortou pela raiz a minha euforia, – fato que me fez voltar o tremendo frio, – e aumentara a minha dúvida. Monise finalmente falou-me:
― A chuva cessou, Leonel, você já pode ir.
Não a respondi, nem sequer me movi, só escutei com tremenda decepção as palavras da moça atormentada, como se tivesse visto o diabo ou qualquer outra coisa que lhe metesse medo. Voltei-me a moça; estava ela de costas pra mim, com as mãos cruzadas e com a capa de chuva por sobre os ombros. Nesta hora senti vontade de falar-lhe tudo o que ela me causou, desde a promessa até a febre; mas fora eu medroso o bastante para ficar mudo. A moça me olhou por sobre os ombros e voltou a falar-me:
― Acho melhor que parta logo, teimoso!
Fiquei embaraçado com o “teimoso”, pois soou imperativo de mais. Dei dois passos até perto dela, queria eu tomar explicação pra aquele tom de voz, mas fui distraído ao ver um vulto se aproximar, que me fez frear os passos e me sentir alerta. Monise voltou-se para o vulto e abriu um sorriso esquisito, parecia ela conhecer o espectro que surgiu da escuridão, um homem com uma cabeleira ruiva, que aparentava ter uns trinta e poucos anos, vestido numa calça jeans mais surrada que o macacão dela, pés descalços, despido da cintura pra cima e com tralhas de pesca por sobre os ombros, trazia na mão alguns peixes amarrados num cipó, e na outra uma faca grande. O homem tinha aparência séria, quase medonha, o semblante era áspero.
― Vejo que hoje está acompanhada, Monise. Quem é o seu amigo?
Monise titubeou. Disse meu nome com a voz fraca e parecia intimidada pela voz grave e forte do homem. Voltando-se a mim, Monise me apresentou o senhor:
― Leonel, este é meu pai.
Eu apertei a mão e disse “muito prazer”, pra demonstrar boa sombra e disfarçar o medo.
― Você pegou muita chuva, rapaz? O que faz você aqui a esta hora?
Demorei formular uma retruca para aquele duplo questionamento, e acabei falando o mesmo que falei a Monise, outrora. Estava eu muito encabulado. O homem tinha a cara de mau, mas era aparentemente bem-humorado. Enquanto o homem me repetia às palavras de alerta do meu velho tio, vi, por trás dele, surgir mais duas pessoas: uma mulher que aparentava ter a mesma faixa de idade do homem (presumi que fosse a sua esposa); tinha os traços de Monise e era sardenta do mesmo jeito; era uma versão gasta da sardentinha; trazia consigo um balde de metal cheio de lagostas. E um garotinho ruivo e branquelo; trazia consigo uma pequena caixinha de madeira (presumi que havia dentro adereços de pesca).
Monise antecipou-se e foi logo apresentando a sua mãe e seu irmãozinho, com o mesmo acanhamento que apresentou o seu pai (era uma família de pescadores! Exclamava eu em pensamentos). Estava eu ali diante da família da mulher por quem me apaixonei... (sim, sim, estimado leitor, eu já podia dizer que estava apaixonado). Era uma situação muitíssima embaraçosa e engraçada ao mesmo tempo. Todos me cumprimentaram cordialmente e me encabulei mais ainda. A mulher notara e rui-se dizendo que as maçãs do meu rosto estavam vermelhas de acanhamento (todos riram, até eu). Monise mirava-me sem piscar os olhos, rindo-se; eu só a mirava de quando em quando, pois assuntava com sua família. Depois de uma breve prosa, o pai de Monise, interrompendo a conversa, disse-me que era hora de partir; apertou-me a mão, ― gesto repetido pela esposa e pelo filhinho; ― Monise foi a última a se despedir, e, diferente dos outros, em vez de me apertar a mão, deu-me um abraço e disse baixinho ao pé do ouvido: “cuidado pelo caminho, eu não quero que lhe aconteça nada de mal antes que eu te fale o significado daquele segundo olhar.”




Relevem os "errinhos" e os "errões" deste texto, não o corrigi devidamente.


No próximo post: A VOLTA PRA CASA

5 comentários:

Hugo de Oliveira disse...

Ótimo texto...não existem erros quando se consegue deixar o leitor fascinado.

Parabéns.


abraços


Hugo

FOTOS-SUSY disse...

OLÁ ROBERTO, BELÍSSIMO TEXTO... ADOREI!!!
BEIJINHOS DE CARINHO,

SUSY

Lorrayne Lindsay disse...

droga!
eles nem se beijaram
rs

ta cada vez melhora =D

beijao

Samyle Lindsay disse...

Empolgante! :D

Esperando 'A volta pra casa'

:)

Anna Vitória disse...

Eita, que Monise mais misteriosa!